Educar na Esperança em tempos de desencanto
- 11 de abr. de 2015
- 7 min de leitura
Atualizado: 28 de jun. de 2021

Esse texto é uma pequena reflexão sobre o livro “Educar na Esperança em tempos de desencanto”, de Chico Alencar e Pablo Gentili.
A Educação, bem como outras áreas relevantes da sociedade, em meio à situação de desencanto em que se encontra a humanidade, exigem de nós um novo olhar sobre fatos concretos de nosso cotidiano, nos conduzindo a uma percepção nítida da urgência de uma nova forma de se fazer educação em nosso país.
Em minha leitura o que ocorre, entretanto, é uma espécie de encantamento ao invés de desencanto, uma vez que no desencanto há percepção e, às vezes, crítica. Quando nos dizemos desencantados de algo é, geralmente, porque estamos descontentes e, numa situação de normalidade, nos empenhamos em modificá-la.
Contudo, esse encantamento a que me refiro é aquele encanto que faz com que homens e mulheres se deixem guiar pela “normalidade” determinada pelos detentores do poder manipulador. Vivemos um tempo em que as pessoas parecem estar “encantadas”, não no sentido do “maravilhamento”, mas no sentido de estar sob o efeito de algo do qual não conseguem se livrar, algo magicamente dominante.
A contemporaneidade tem me parecido definida pela significativa ausência de expectativas e mudanças, talvez justificando o crescente aumento de depressivos e suicidas. Alguém sem projeto de vida, sem perspectivas, sem ideal acaba sucumbindo a si mesmo. Se o encanto é o ato ou efeito de maravilhar-se com alguma coisa, o (des)encanto é o oposto. Não existe mais esse maravilhar-se! Caiu-se em um conformismo, uma aceitação generalizada do que nos é pro(im)posto. É uma aceitação anestesiante das circunstâncias, um encanto negativo a que somos submetidos que nos faz desanimados e, por vezes, perdidos de nós mesmos.
Tendo-se chegado a esse patamar, já não mais se fazem presentes linhas éticas ou padrões morais que venham justificar esse posicionamento. Nada justifica a apatia em que está inserida a sociedade contemporânea.
“Isso é assim. Não adianta que não vai mudar!”, dizem os (des)encantados. Aquele desejo de mudança, aquela luta por um ideal, agora se vê sufocado pela força dessa “magia negra” que faz do homem um ser apático, inerte em meio à realidade – sensação vazia de liberdade.
Até mesmo a tecnologia, que deveria ser um recurso e auxílio na qualidade de vida tem sido causa de uma vida maltratada e desgastante para milhares de seres humanos escravizados por ela, pela vazia e mentirosa ideia de perfeição. A ausência de emprego tem feito vítimas em todos os lugares. Os jovens estão lançados num estado de anestesia e (des)encanto profundo, mergulhados nas águas cada vez mais profundas do individualismo. A velhice já não mais é tempo de tranquilidade, mas de preocupações ainda maiores que as do tempo da juventude.
Interessante ressaltar aqui essa característica cultural quase que generalizada do individualismo que, mesmo ocultada, tem sua face percebida nos altos e crescentes índices de drogadição, suicídio, alcoolismo, marginalidade e desemprego. Está estampada nas ruas na queima de índios, nos mendigos apedrejados, no linchamento de imigrantes e tantas outras situações apresentadas nos noticiários. Ao mesmo tempo em que se está com muita gente ao redor, se está sozinho, vazio de sentido e de sentimento de pertença a uma pólis que nos distingue dos demais animais gregários, como ensina Aristóteles.
A emancipação da sociedade, que antes fazia o homem feliz, agora não mais preenche esse papel. O que o faz feliz agora é a posse de bens, o dinheiro que produz coisas, a satisfação irracional de seus sonhos de consumo, a hipnose da estética anoréxica que tem sido mais tentadora que encontrar-se consigo mesmo.
Ao fracasso do socialismo talvez se deva todo este constrangimento, esse desencanto atual da sociedade. Este movimento (o socialismo) prometeu realizar os sonhos de liberdade, justiça e igualdade, negados pela realidade excludente do capitalismo selvagem.
Essa epocalidade de mudanças contínuas e extremas nos coloca em uma encruzilhada moral e ética, exigindo mudanças drásticas nas políticas mundiais, priorizando a educação para a cidadania, com espírito crítico e questionador do cidadão que se percebe parte do todo, não figura isolada na luta pelos interesses particulares.
Ou conseguimos, com luta, uma mudança entre nossos jovens e crianças, mudança esta que esteja centrada na ânsia sincera por justiça e paz, ou estaremos fadados a continuar vivendo entre desastres, atentados, guerras e degradação que culminarão na destruição do planeta.
Esse (des)encanto, na esfera educacional, tem seu princípio no próprio direito à educação, sobretudo em determinados segmentos da sociedade. Os reformadores do sistema educacional apontam para uma crise de qualidade, e dizem que tal crise ocorre por consequência de pouco e desqualificado trabalho docente. Contudo, apesar de significativas mudanças ocorridas no século XX, não se pode atribuir responsabilidade a esse ou aquele quando se precisa tomar o todo avaliado. O sistema educacional mudou, as características sócio-educacionais são outras, contudo, as mudanças ocorridas parecem ter sido pouco participativas (sociedade individualista), havendo sim uma série de acordos corporativos ocultos sob a fachada tecnocrática, como se tal reforma fosse de interesse tão somente dos especialistas, não de toda a sociedade que faz uso desse sistema educacional.
As mudanças nem sempre ocorrem como queremos e no volume necessário, porém, a piora percebida nas condições de trabalho docente se destaca nesse cenário de (des)encanto, gerando uma síndrome que afeta os trabalhadores da educação: a síndrome de burnout, ou síndrome da desistência.
Encurralados entre o que desejam e o que realmente podem fazer, o sentido do trabalho educacional vai se perdendo, o desencanto vai apoderando-se da ação, o ceticismo vai tomando conta de muitos, algumas vezes oculto atrás de um suposto realismo (aquelas justificativas que encontramos para desistir ou nos negarmos à efetivação de um trabalho de qualidade). A situação atual parece conduzir a um pensamento de que qualquer esforço por mudança é inútil.
A crise da desistência, ou síndrome de burnout, está impregnada pelo esgotamento emocional, despersonalização e falta de compromisso com o trabalho. Marcados por estes aspectos os docentes tem manifestado o desencanto pela escola e na escola (faça um pequeno teste e avalie).

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