Não faz mais que a obrigação!
- por Mário Costa
- 28 de fev. de 2016
- 3 min de leitura
Atualizado: 28 de jun. de 2021

Dia desses ouvi, novamente, a frase que intitula esse comentário. Confesso que, num primeiro momento, me causou certa revolta interior tê-la ouvido no contexto em que ouvi. Dias depois, ainda “sacudido”, li um comentário no Facebook – diga-se de passagem, sem qualquer fundamento sólido para as afirmativas ali escritas, contendo a mesma frase: “não faz mais que a obrigação!”.
Como a inquietação se repetiu, coloquei-me a refletir sobre a bendita frase provocativa, buscando na reflexão argumentativa sólida – que é meu refúgio, um amparo para compreender o porquê da verbalização de tal máxima sem ao menos pensar a respeito, já que quem assim se manifesta, manifesta a própria arrogância e ignorância política total.
Minha reflexão teve início na etimologia da palavra “obrigação”. Derivada do latim obligatio, é um substantivo que designa a ação de obrigar; o fato de estar obrigado a fazer uma ação. Ou ainda, aquilo que é ou se tornou necessidade moral de alguém, um dever, um encargo. Pois bem, de posse da informação mais precisa da palavra, o que me inquietou foi confirmar que, nem sempre, as pessoas a quem são conferidos encargos ou “obrigações” se prestam a cumpri-los.
De fato, conferir encargo não garante a execução do mesmo!
Assim como é obrigação do estudante estudar, da mãe cuidar dos filhos, do político devolver à população em forma de bens e serviços os impostos por eles pagos, nem sempre as “obrigações” são cumpridas ou cumpridas com competência. É obrigação, mas nem todos exercem seu ofício com o empenho esperado. É obrigação, mas tem todos se preocupam em atender com eficácia àquilo que, de fato, se faz necessário.
Ou seja, nem sempre ter obrigação é pressuposto do cumprimento da mesma!
A ignorância política daquele que verbaliza o título desse comentário sem ao menos refletir o que tal frase representa se esquece que, mesmo cumprindo uma obrigação conferida a si por ocasião do seu cargo ou ofício, o cumpridor da “obrigação” difere-se de tantos outros que, num cenário de crise moral, pouco se importam em cumprir seus deveres.
É lamentável perceber professores dizendo a seus alunos que esses não fazem mais que a obrigação. É lamentável ouvir pessoas dizendo que pais zelosos não fazem mais que obrigação em cuidar de seus filhos. É lamentável ouvir cidadãos dizendo que os administradores públicos não fazem mais que a obrigação quando atendem às necessidades da população entregando bens e serviços.
É sim obrigação, contudo, num cenário de crise moral e ética, onde nem todos se comprometem em cumprir os deveres conferidos por seus cargos ou funções, deveríamos, justamente por tê-lo cumprido, parabenizar o cidadão que assim age. O aluno, por ter cumprido seu dever, merece sim o elogio, a premiação. A mãe, por ser zelosa, mesmo sendo o zelo materno uma condição implícita à maternidade, merece ser destaque dentre tantas outras que abandonam seus filhos. O político que se compromete em exercer com lisura a administração pública, mesmo tendo se predisposto a fazê-lo em prol da sociedade, faz jus a um reconhecimento social, já que não é, infelizmente, uma prática tão efetiva, sobretudo nesse nicho.
Assim, convido o leitor dessas poucas linhas a refletir antes de proferir comentários desta natureza, já que a infeliz afirmativa pode gerar desmotivação naqueles que, se diferenciando de tantos outros por cumprirem seu papel (não fazer mais que a obrigação), uma vez agredidos em sua integridade moral, podem, das duas uma, ou deixar de cumprir o dever – já que muitos não o fazem, ou deixar de fazer parte do ambiente que não reconhece em sua ação, um diferencial de quem se mantém moralmente correto.
Sim, ele(a) não fez mais que a obrigação, mas se ele(a) não fosse competente para saber gerenciar seu tempo, emoções e recursos, será que o resultado seria positivo? A resposta pessoal a essa pergunta é fundamental!
Logo, existe sim mérito em quem cumpre obrigação! Medíocres são aqueles que, sempre olhando de fora, além de se sentirem desobrigados em participar, não tem mérito algum em sequer conseguir pensar antes de falar, tornando-se papagaios que repetem outras falas.
Papagaios falam imitando sons domésticos porque foram colocados em cativeiro pois, na natureza, eles cantam. Voltemos a cantar, a sermos suaves, porque o cativeiro da ignorância nos tem feito reproduzir os sons da arrogância, da prepotência de sermos donos da verdade, falando e agindo de modo vazio e inconsequente.

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